Quinta-feira, 31 de Maio de 2007

Um Sobradense foi numa daquelas viagens ( tudo pago) e cuja finalidade é a promoção e venda de colchões. Depois de bem comidos e bem bebidos, os viajantes eram encaminhados aos vendedores. Um dos Sobradenses fica tentado. Diz nada resolver sem o consentimento da mulher. Que lhes liga no dia seguinte. A mulher ao primeiro diz que não, que é caro, que não precisa, mas o diabo é tendeiro, e a noite faz com que amoleça e concorda com a compra.

Ao outro dia ligam os vendedores, ainda antes do Sobradense. Acerta-se a compra. 300 contos o colchão ( já com descontos) e de oferta um ferro com caldeira no valor de 40 contos. Óptimo negócio.

Mas mais uma vez o faro comercial do Sobradense havia de dar provas da sua destreza, depois de uma noite de conselhos com a almofada, liga aos vendedores. Tem uma proposta.

- "(...) eu tive a pensar, e eu tenho ferro e atão na vez do ferro, e já que vale 40 contos, descontava-se o ferro no colchão. p'ra mim dava-me jeito e a vós também porque depois davas a oitro... "

- " pois mas o ferro é dado, é uma oferta..."

- " pois é dado, mas vale 40 contos e descontado e pagava só 260 contos plo colchão..."

Negócio invalidado na subtração do valor do ferro. Validado na conta dos vendedores que venderam mais um colchão com a oferta incluída.

Ficou a estória e um negócio que podia ter dado certo... não fosse oferta.


sinto-me: de bem com ofertas
música: i belive i can by

publicado por estoriasdaminhaterra às 16:13
Quarta-feira, 30 de Maio de 2007

Como já devem ter percebido, ao longo das estórias, existem expressões típicas. não sei até que ponto serão de facto " made in Sobrado", o facto é que são usadas na terra, com maior ou menor regularidade. Já era pois tempo de terem direito a um post só delas e com as devidas conversões em " português".

 

A monte - abandonado; relativo a terrenos que são deixados ao abandono;

Chamar à pedra- Pedir satisfações

Acertar o passo - Bater

Carreiro - caminho

cumprar- comprar

mercar- comprar

diacho- diabo

enchido a pança - comido bem

galocthas- galochas

meliante- patife; individuo de acções dúbias;

 

(...) continua


sinto-me: poliglota

publicado por estoriasdaminhaterra às 21:48
Quarta-feira, 30 de Maio de 2007

O meu bisavô era um homem imponente. E recto. A estória dele relata o modo como educou os filhos e o seu sentido de justiça.

Haviam dito, de um filho, coisas impróprias à época, tendo o zunzun da situação chegado aos ouvidos do meu bisavô. Chamou o filho " á pedra" e pediu esclarecimentos. O jovem lá se esclareceu consoante podia e sabia. O pai meditou, e deu de sentença. Que tivesse uma conversa de pé de orelha com o autor da difamação ( afim de limpar o nome). Local marcado - à saída do adro da igreja, após a missa de domingo. A cobrir a situação, o meu avô, à época com 14/15 anos e o irmão com uns 17/18. O pai assistiria de longe. Assim foi.

À saída do adro colocou-se um irmão de cada lado do portão. Sai o meliante, o irmão ofendido pergunta-lhe se não tem nada para dizer. Não lhe dá tempo para responder, agarra-o pelos colarinhos e acerta-lhe o passo ( como quem malha centeio). Os fieis cercam a luta, há quem tente apartar, o irmão mais novo interpõe-se ameaçando, " quem se meter vai prali também. Ninguém se mete. De longe o pai assiste. Quando vê que já está em boa conta o acerto, desce calmamente o passal, coloca a mão no ombro do filho e diz : " Anda daí rapaz, vamos para casa." Abandonam o três o local, calmamente, o outro jovem fica no chão. Estavam ajustadas as contas e limpo o nome.  


música: Toma que já almoças-te
sinto-me: justiceiros

publicado por estoriasdaminhaterra às 13:49
Terça-feira, 29 de Maio de 2007

Foi uma partida familiar que teve repercursões não calculadas. Não deixa de ser caricata, podendo até servir como uma estória daquelas que terminamos com a famosa expressão " moral da estória"...

Um dos passatempos preferidos da miudagem era tocar campainhas. E fugir. E depois, à socapa espiar o apanhado vir à porta ver quem era, enquanto nos riamos da patifaria.

Numa noite de verão, os "netos" da família decidiram fazer das suas. Eu incluída. Aliás a ideia foi minha. Sabia quem tinha campainhas novas, e sabia que um tio nosso tinha posto uma com um som muito catita. Lá fomos nós. Um jogo de toca e foge, que começou ao pé da casa do avô e se estendeu até ao fim da rua. Última casa visitada, a do tio Manel.

Eu espero distanciada. O Tozé toca, olha para a varanda, toca outra vez e foge. Eu também. Rimo-nos quando chegamos a casa do avô. Noite em grande.

Mas ao outro dia é que havia de ser lindo. Como se devia esperar, o resultado.Não aquele que esperávamos.

O meu tio conta ao meu avô que lhe iam assaltar a casa na noite anterior, tocaram à campainha a ver se estava gente em casa. ( ladrões corteses).Vim à varanda e ainda vi um "meliante" a correr.

O meu avô conta à minha mãe e por sua vez a minha mãe ao meu pai à hora de almoço. Eu também ouço. Começo-me a rir perante as caras de espanto dos meus pais. Só depois de conter o riso explico, o meliante era o meu primo, e foi o nosso passatempo a seguir ao jantar da noite anterior. Tocar as campainhas e fugir.

Os meus pais também se riram. O meu primo não, ficou com medo, sabe-se lá, de que o meu tio o apanhasse julgando-o ladrão e lhe desse uma "Trepa".O facto é que o nosso tio nunca soube a verdade. Conto agora apenas porque já se passaram muitos anos e acredito que o " crime" já tenha prescrito, de qualquer forma, acabou-se a brincadeira do toca e foge naquela noite.Pelo menos da nossa parte.


sinto-me: anjinhos levados da breca
música: trim trim

publicado por estoriasdaminhaterra às 09:24
Segunda-feira, 28 de Maio de 2007

A estória do irogo já é mais uma lenda que uma estória. Diz quem conta que aconteceu na Costa, num passado pouco longuínquo. Os protagonistas ( á parte o irogo), já são personagens recorrentes nestas adanças.

Reza a estória que a bomba do poço encravou. Desceu-se ao poço a fim de a reparar e descobrir o que a havia encravado. Coisa nunca antes vista, um irogo entrou na bomba e encravou-a, e, segundo contam de tão grande que era deu para os da Costa comerem todos e ainda sobrou um bocadito para os de Ferreira . A cabeça, essa andou a calçar a roda de um carro e bois durante umas semanitas.

 

 

Irogo- macho da enguia

os da Costa- habitantes do lugar da Costa

os de Ferreira- habitantes do lugar de Ferreira

 


sinto-me: extasiada

publicado por estoriasdaminhaterra às 16:54
Sexta-feira, 25 de Maio de 2007

Esta deveria ter sido contada por alturas da Páscoa, quando se costumavam realizar estas patifarias. Não contei, conto agora.

Na noite de Ramos era costume a mocidade da terra se juntar em grupos ( consoante os lugares) e mudar de sitío vasos, utensílios agricolas etc, colocando-os normalmente no centro ( em Campelo). Ao outro dia, os donos, depois da missa, encarregavam-se de os levarem de novo para casa.

De uma das vezes estando um grupo de jovens a levar um carro de bois para o centro, cruzam-se com o dono na ponte Stº André. O dono não reconhece o carro e desafia os jovens a pendurá-lo na ponte. Não se fazem rogados, penduram-no e o dono até ajuda. Só ao outro dia, quando não vê o carro de bois no sítio do costume, se apercebe da marosca. Restou-lhe ir buscá-lo ao sítio onde havia ajudado a colocá-lo.


música: Quem mal anda mal acaba
sinto-me: grande ideia!

publicado por estoriasdaminhaterra às 09:48
Quinta-feira, 24 de Maio de 2007

 Sobrado tem perdido a sua ruralidade. A cada ano que passa veêm-se mais terrenos a monte, mais construção, mais desenvolvimento, mais tudo. Tem, como em tudo na vida, os seus prós e contras.

A estória de hoje aconteceu num passado mais ou menos longínquo, quando Sobrado ainda conservava a sua ruralidade em estado bruto.

Nessa altura os bens alimentares eram "da casa", o porco que se matava, as batatas da horta, as couves, o feijão a cenoura do quintal, o pão do forno ( a lenha) de casa.

As actividades domésticas e familiares desenvolviam-se, essencialmente à lareira ( onde se cozinhava, dormitava, comia, conversava etc.).

Estando o inverno a bater à porta, a lareira já chamava os habitantes do pequeno casebre ao seu calor. Assim, reuniam-se à sua volta, pai, mãe, filhos e cão. À medida que as horas passavam , a conversa fora-se esmorecendo, a lareira também e o sono apoderando-se dos habitantes. Todos dormiam, lareira e candeia incluídos. A mãe acorda, e meia atordoada, lembra-se que não tinha posto o pão ao forno. Levanta-se e tacteia a cozinha, encontra a pá com a massa em cima, num gesto decidido "coloca" a massa no que julgava ser o forno. Puro engano. O luar, reluzia sobre a janela sem vidros,as estrelas faziam lembrar as brasas aiinda semi encandescentes, ludibriando assim a pobre camponesa que julgava a janela por forno. Só ao outro dia deu por ela, quando no forno não encontrou nada mais que espaço. 

 


tags:
música: Quem me leva o meu pao?
sinto-me: e agora?

publicado por estoriasdaminhaterra às 11:52
Quarta-feira, 23 de Maio de 2007

Como já referi noutros posts, Sobrado é terra de ciclistas. E a febre tem crescido significantemente desde a vitória da Volta a Portugal por Nuno Ribeiro e, recentemente com a criação de uma associação de btt ( Sobradobttclube- http://sobradobttclube.blogspot.com/ ).

Ora a estória de hoje é uma conversa entre dois ciclistas amadores ( sobradenses), um na casa dos 40 e outro na casa dos 60 e muitos, ambos praticantes solitários, mas assíduos da modalidade.

Chega o ciclista mais jovem ( devidamente equipado) de mais um percurso duro, o ciclista mais velho admira-lhe a fatiota e pergunta-lhe:

- Essa "casaca" (  casaco)é boa hei-de cumprar ( comprar)uma.

- É, é boa, ao cima abre-se o fecho e ao baixo fecha-se por causa do frio. Transpira-se é muito.

- Ai transpira!? Então não quero. Eu no outro dia ia a subir o carreiro (estrada nacional que liga a paredes)e taba bento( estava vento), a meio há lá um talho, eu parei entrei e pedi uma folha de jernal. O home deu-me o jernal todo, mas eu disse-lhe naaaãooooo uma folha só. Então meti a folha de jernal no peito,o jernal absorve o suor e nao deixa entrar o frio, é uma maravilha.  

O ciclista mais jovem obviamente, concordou acenando com a cabeça e procurando ao mesmo tempo segurar o riso enquanto a sua mente imaginava a cena...


música: pelos caminhos de POrtugal
sinto-me: gelada com a ideia

publicado por estoriasdaminhaterra às 10:43
Terça-feira, 22 de Maio de 2007

As reuniões familiares sempre são boas fontes de recurso " estórico". Descobrem-se muitas coisas, inclusive que a igreja matriz, num dia mais ou menos longínquo, abanou. 

Era costume, segundo se conta, rezar-se o terço ao domingo à tarde na igreja. Eram terços demorados e penosos para quem tinha ainda menos de dez anos, e o sol e as brincadeiras chamavam com uma voz incessante,voz, que normalmente só sentimos na infância.

A única coisa boa do terço de Domingo era, o tempo antes do terço. Em que as crianças corriam á volta da igreja ( no adro), dando assim asas às suas brincadeiras.

Ora numa dessas brincadeiras a coisa deu para o torto, uma das crianças tropeçou e bateu com a cabeça na esquina da igreja, fazendo um golpe na testa. Apesar de ensanguentar todos os lenços dos fieís , assistiu com especial devoção ao terço. Só ao chegar a casa foi, de bicicleta com o pai ao hospital de Valongo.

Mas o que tornaria a estória peculiar foram os comentários posteriores de um dos fieis, ao pai da criança.

- Oh fulano a tua Ana Maria deu cá um tombo na igreja, que eu estava lá dentro e até senti a igreja a abanar, abanou mesmo...

Consta-se que nunca mais abanou daquela forma a igreja de Sobrado.



publicado por estoriasdaminhaterra às 11:00
Segunda-feira, 21 de Maio de 2007

A morte costuma chegar com um aviso, " toca a todos". Acredito que a dor da perda de um familiar também esteja, de certa forma, associada á consciência intrínseca de que nada é eterno e tudo acaba. A estória de hoje, narra mais uma relação do homem com a morte.

Tinha morrido o pai de um Sobradense. Acontecimento comum. Os vizinhos e amigos iam chegando e dando os sentimentos pela perda, aos familiares. Procedimentos normais nestas ocasiões. No entanto, um dos filhos do pai defunto, tomou diferente atitude. De mão estendida foi cumprimentando os presentes desejando os se'timentos. Até que, e numa clara tentativa de abreviar a " coisa", levanta os braços ( no passal) e em sonora voz deseja conduídamente, "se'timentos p'ra todos, se'timentos p'ra todos", virando costas e seguindo o cortejo fúnebre.



publicado por estoriasdaminhaterra às 10:15
O blogue estoriasdaminhaterra recolhe estórias da tradição oral sobradense bem como factos da vida comum de uma pequena vila dos arredores do Porto...
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